120532.fb2
Will Farnaby preparou sua refeição da manhã e, quando o dr. Robert voltou de sua visita ao hospital, estava tomando sua segunda xícara de chá palanês e comendo fruta-pão torrada com geléia de toronja.
— Lakshmi não sentiu muitas dores durante a noite — disse o dr. Robert, respondendo às suas perguntas. — Dormiu um bom sono durante quatro ou cinco horas e, ao despertar, conseguiu tomar um pouco de caldo. Podemos contar com outro dia de adiamento. Assim sendo, e como deve ser cansativo para ela me ver sempre a seu lado, resolvi ir até o Posto de Grandes Altitudes, a fim de trabalhar durante algumas horas com o grupo de pesquisas do laboratório farmacêutico. A vida continua e tem que ser vivida da melhor maneira, Will.
— São os trabalhos com o moksha!
O dr. Robert balançou a cabeça.
— Não, os trabalhos com o moksha estão limitados atualmente à simples repetição das experiências clássicas. Como se trata de coisa rotineira, essas experiências são realizadas por técnicos. Os pesquisadores estão ocupados com alguma coisa inteiramente nova.
Começou a falar dos indóis recentemente isolados de sementes de ololiuqui que, trazidas do México no ano anterior, estavam crescendo no jardim botânico do posto. Pelo menos três indóis diferentes já haviam sido isolados. Um deles parecia ser bastante ativo, e experiências feitas em animais demonstravam que afetava o sistema reticular.
Ficando sozinho, Will sentou-se sob um ventilador e continuou a leitura das Notas sobre o que é quê.
Não podemos racionalizar excluindo nossa irracionalidade básica. E o melhor que temos a fazer é aprender a arte de sermos irracionais de uma maneira razoável.
Em Pala, decorridas três gerações após a reforma, não existem «rebanhos de carneiros» nem bons pastores para tosquiá-los e castrá-los. Também não existem os rebanhos de bovinos e de suínos. Tampouco existem marchantes (da realeza, das classes armadas, do capitalismo ou das revoluções) que tenham a necessária permissão para marcá-los a fogo, confiná-los e retalhá-los. Existem somente associações voluntárias de homens e mulheres que buscam uma humanidade integral.
Cantigas ou seixos? Desfiles ou coisas substanciais? «Cantigas», respondem o Budismo e a ciência moderna. «Seixos», dizem os filósofos clássicos do Ocidente. O Budismo e a ciência moderna pensam a respeito do mundo em termos de música. A imagem que nos vem à mente quando lemos os filósofos do Ocidente é a de uma figura num mosaico bizantino. Uma figura rígida, feita de milhões de pequeninos quadrados de algum material pétreo, firmemente cimentado nas paredes de uma basílica sem janelas.
A graça de uma dançarina e a artrite que surge após terem decorrido quarenta anos — ambas as coisas são funções do esqueleto. Graças a uma inflexível moldura óssea a moça é capaz de executar piruetas. E é por causa desses mesmos ossos que sua avó fica condenada à cadeira de rodas. De modo análogo, um firme alicerce cultural é a condição essencial a toda a originalidade individual e a todo o poder criador. Mas essa cultura básica é também o seu mais terrível inimigo. A coisa sem a qual não nos podemos transformar em seres humanos plenamente desenvolvidos é, freqüentemente, a mesma que impede esse desenvolvimento.
Após um século de pesquisas com o moksha, chegamos à conclusão de que pessoas inteiramente comuns são capazes de ter visões, sendo mesmo capazes de se sentir inteiramente liberadas. A esse respeito, tanto os homens como as mulheres que fazem ou que apreciam a cultura não são melhores que os incultos. Um alto nível de cultura é perfeitamente compatível com a pobreza de expressões simbólicas. As expressivas imagens criadas pelos artistas de Pala não são melhores do que as que foram produzidas pelos artistas de outras partes do mundo. Sendo produtor da felicidade e de um sentimento de completa realização, são provavelmente menos vivos, e talvez nos satisfaçam menos sob o ponto de vista estético que as trágicas figuras criadas como motivo de compensação pelas vítimas da frustração, da ignorância, da tirania, da guerra e de todos os crimes culposos que alimentam as superstições. A superioridade palanesa não repousa em imagens simbólicas e sim numa arte que, embora mais elevada e de maior valor que todo o resto, pode ser executada por qualquer um — a arte de ter uma experiência adequada. A arte de se tornar mais intimamente familiarizado com todos os mundos nos quais habitamos. A cultura palanesa não é para ser julgada pelos mesmos critérios (e ainda nos falta coisa melhor!) com que julgamos as outras culturas. Não é para ser julgada pelos feitos de uns poucos manipuladores privilegiados das imagens simbólicas ou artísticas. Deve ser julgada pelo que todos os seus membros (os comuns e os superiormente dotados) fazem e experimentam em cada contingência e a cada intersecção do tempo com a eternidade!
O telefone começou a tocar. Devia deixá-lo tocar ou seria melhor atender e dizer que o dr. Robert tinha se ausentado por um dia? Decidindo-se pela segunda alternativa, Will tirou o fone do gancho.
— É do bangalô do dr. MacPhail — respondeu, parodiando a eficiência de uma secretária —, mas o doutor não está e não voltará hoje.
— Tant mieux — disse a rica voz real no outro lado da linha. — Como vai, mon cher Farnaby?
Surpreso e gaguejando, Will agradeceu as delicadas perguntas de Sua Majestade.
— Então eles o levaram ontem à tarde para assistir a uma das chamadas «iniciações»? — perguntou a rani.
Tendo se recuperado parcialmente da surpresa inicial, Will respondeu com voz neutra e não comprometedora:
— Foi uma coisa extraordinária!
— Extraordinária! — disse a rani, demorando-se enfaticamente nos equivalentes falados, pejorativos é laudatórios das letras maiúsculas. — Mas não passa de uma Caricatura Blasfema— tória da VERDADEIRA Iniciação! Eles nunca aprenderam a fazer a mais elementar distinção entre a Ordem Natural e a Sobrenatural.
— Absolutamente — murmurou Will. — Absolutamente.
— Que foi que o senhor disse? — perguntou a voz do outro lado da linha.
— Absolutamente — repetiu Will, em tom mais alto.
— Estou satisfeita com a sua anuência, mas não lhe telefonei para discutir a diferença entre o Natural e o Sobrenatural — disse a rani. — Telefonei para lhe falar de coisa mais urgente.
— Petróleo?
— Sim — confirmou ela. — Acabei de receber uma comunicação muito intranqüilizadora e que foi remetida pelo meu representante pessoal em Rendang. Trata-se de pessoa altamente situada e sempre bem informada — acrescentou.
Will começou a pensar qual de todos aqueles convidados educados e cheios de medalhas, no coquetel do Ministério das Relações Exteriores, tinha traído seus companheiros, que por sua vez também eram traidores. E nesse grupo ele também se incluía.
— Nos últimos dias — prosseguiu a rani — representantes de nada menos que três das maiores companhias de petróleo, européias e americanas, chegaram de avião a Rendang-Lobo. Soube pelo informante que eles já estão «trabalhando» as quatro ou cinco figuras-mestras da Administração que possam, no futuro, influir na decisão sobre quem deverá obter a concessão em Pala.
Will estalou a língua em sinai de desaprovação.
Quantias consideráveis, deu a entender a rani, tinham sido, se não diretamente oferecidas, pelo menos mencionadas, com a intenção de deixá-los ficar à mercê das tentações.
— Execrável! — comentou Will.
— O senhor usou a palavra exata — disse ela. — E é por isso que alguma coisa tem que ser feita imediatamente.
A rani soubera, por intermédio de Bahu, que Will já tinha escrito a lorde Aldehyde e que, certamente dentro de poucos dias, uma resposta deveria chegar. Mas uma espera de alguns dias era demasiado longa. O tempo era essencial, não somente por causa do que aquelas companhias rivais estavam fazendo, mas também — e a rani falou baixo, em tom de mistério — por outras razões. Imediatamente, imediatamente, começou a exortar. Imediatamente, sem mais delongas. Lorde Aldehyde deveria ser informado por telegrama de tudo o que estava acontecendo (o fiel Bahu havia se oferecido para transmitir a mensagem em código, por intermédio da Legação de Rendang em Londres, disse ela) e, juntamente com a informação, teria de seguir um pedido urgente, a fim de que Will, na qualidade de correspondente especial, tivesse poderes para tomar as decisões (nessa altura, as decisões seriam predominantemente de caráter financeiro) que se fizessem necessárias para assegurar o triunfo da Causa Comum.
— Com sua permissão — continuou —, direi a Bahu para telegrafar imediatamente. O telegrama será assinado por nós dois, Mr. Farnaby. Penso, mon cher, que isso será agradável para o senhor.
Não havia nenhum motivo para se sentir lisonjeado, mas também nada havia que pudesse justificar uma negativa de sua parte, uma vez que tinha escrito para Joe Aldehyde a fim de que objetasse. Procurando demonstrar o máximo de entusiasmo, em virtude da longa pausa que havia feito enquanto procurava outra solução, Will respondeu que sim.
— Amanhã deveremos receber alguma resposta — acrescentou ele.
— Receberemos Hoje à noite — assegurou-lhe a rani.
— A senhora acha que é possível?
— Com a ajuda de Deus, tudo é possível — respondeu expressivamente.
— É verdade — disse Will. — Mas…
— Sigo o que minha Pequena Voz me diz, e ela está me dizendo: «Hoje à noite». Está dizendo também que «ele dará carta branca», carte blanchez Mr. Farnaby, e que Mr. Farnaby será inteiramente bem-sucedido — disse cheia de entusiasmo.
— Que maravilha — respondeu Will, em tom de dúvida.
— O senhor deverá obter sucesso.
— A senhora acha possível?
— Deverá ter — insistiu a rani.
— Por quê?
— Porque foi Deus quem me inspirou a lançar a Cruzada do Espírito.
— Não consigo perceber a correlação.
— Talvez não devesse lhe dizer. — Parou de falar por algum tempo e depois prosseguiu. — Mas, afinal de contas, que mal há nisso? Se a nossa causa triunfar, lorde Aldehyde prometeu apoiar integralmente a Cruzada do Espírito. Como Deus quer o sucesso da Cruzada, a nossa causa não pode deixar de vencer.
— QED… — Quis gritar, mas se conteve. Não seria educado. De qualquer modo, o assunto não era para brincadeira…
— Vou desligar, porque tenho de falar com Bahu. A bientôt, meu caro Farnaby. — E, após um novo «bientôt, meu caro Farnaby», desligou.
Com um encolher de ombros, Will recomeçou a leitura das Notas sobre o que é quê. Que mais havia para fazer?
Dualismo… Sem isso é dificílimo haver boa literatura. Com isso, a possibilidade de uma boa Vida não pode existir. «Eu» indica a existência de uma «coisa» que subsiste em mim. «Sou» nega o fato de que toda a existência é conexão e mudança. «Eu sou». Duas palavras pequenas; mas que imensidão de inverdades! O dualista dotado de mentalidade religiosa «extrai» o espírito do seio das profundezas abismais. O não-dualista «convoca» a imensidão para a intimidade do espírito. Em outras palavras, crêem que essa imensidão já se encontrava no âmago do espírito.
Will ouviu o barulho de um carro que se aproximava. Ao silêncio que se fez, quando o motor foi desligado, seguiu-se o som do bater de uma porta, o ruído de passos no cascalho e depois nos degraus da varanda.
— Você está pronto? — perguntou Vijaya na sua voz grave.
Pondo de lado as Notas sobre o que é quê, apanhou seu bordão de bambu, levantou-se e dirigiu-se para a porta de entrada.
— Pronto e cheio de entusiasmo — disse Will, ao se encaminhar para a varanda.
— Então vamos — disse Vijaya, segurando-lhe um dos braços e recomendando-lhe para ter cuidado com os degraus.
Uma mulher gorda, de rosto redondo, aparentando quarenta e cinco anos, estava em pé, ao lado do jipe. Usava um vestido cor-de-rosa e estava adornada com um colar e brincos de coral.
— Apresento-lhe Leela Rao — disse Vijaya. — É nossa bibliotecária, secretária, tesoureira e mantenedora da ordem. Sem ela, estaríamos perdidos.
Enquanto a cumprimentava, Will imaginou estar diante de uma versão mais escura dessas delicadas e incansáveis senhoras inglesas que, quando os filhos já estão criados, se dedicam às obras de caridade ou às organizações culturais, e que, embora sem serem dotadas de muita inteligência, são desprendidas, dedicadas, genuinamente boas e… horrivelmente maçantes.
— Os meus amigos Radha e Ranga já haviam me falado do senhor — disse Mrs. Rao quando marginavam o lago de lótus e se dirigiam para a rodovia.
— Espero que tenham me aceito com o mesmo entusiasmo com que os aceitei.
— Fico tão satisfeita em saber que o senhor gosta deles! — disse Mrs. Rao com a fisionomia irradiando alegria.
— Ranga é excepcionalmente inteligente — disse Vijaya.
— E como consegue manter em perfeito equilíbrio a introversão e o mundo exterior! — esmerou-se Mrs. Rao. — Apesar de sempre tentado (e como!) a escapar para o mundo do nirvana de arhat ou para o pequeno paraíso tão lindamente arrumado da abstração pura. Sempre tentado e muitas vezes resistindo às tentações, pois o Ranga cientista de arhat também é um outro ser. É um Ranga compassivo e que está sempre pronto (se soubermos como atraí-lo) a aceitar as realidades da vida, a ser cônscio das suas responsabilidades e a prestar um auxílio eficiente. Que felicidade para ele e para todos nós que tenha encontrado uma pequena como Radha, que é simples, inteligente, alegre, meiga e tão ricamente dotada para o amor e a felicidade. Radha e Ranga estavam incluídos entre os meus alunos prediletos — confessou Mrs. Rao.
«Alunos de alguma espécie de escola dominical budista», pensou Will com condescendência. Mas a realidade o supreendeu quando soube que nos últimos seis anos essa devotada pioneira, nas folgas do seu serviço de bibliotecária, ensinava aos jovens a ioga do amor. Imaginava que os métodos que haviam afastado Murugan e que a rani, com toda a sua possessividade incestuosa, classificara de «ultrajantes», deviam ser os mesmos. Will abriu a boca para fazer algumas perguntas, porém conteve-se a tempo; seus reflexos haviam sido condicionados para latitudes maiores e para «pioneiras» de outro tipo. As perguntas simplesmente se recusaram a sair dos seus lábios e agora já era tarde demais para fazê-las. Mrs. Rao começara a falar acerca de sua outra ocupação.
— Se você soubesse o trabalho que dão os livros aqui neste clima! — dizia ela. — O papel apodrece, a cola se derrete, as encadernações não resistem, os insetos os devoram. A literatura é realmente incompatível com os trópicos.
— Se formos acreditar no seu velho rajá, a literatura também é incompatível com vários outros aspectos locais. É incompatível com a integridade humana, com a verdade filosófica, com a sanidade individual e com um sistema social condigno. É incompatível com tudo, exceto o dualismo, a demência criminosa, as aspirações impossíveis e os sentimentos de culpa desnecessários. — Sorrindo ferozmente, Will continuou: — Mas não se preocupem com isso, o coronel Dipa endireitará tudo. Depois que Pala for invadida e salva pela guerra, pelo petróleo e pela indústria pesada, vocês terão, sem a menor dúvida, uma Idade de Ouro na literatura e na teologia.
— Gostaria de poder rir, mas é bem provável que você esteja inteiramente certo — disse Vijaya. — Tenho um desagradável pressentimento de que os meus filhos crescerão para ver a realização da sua profecia.
Deixando o jipe estacionado à entrada da aldeia, entre um carro de bois e um caminhão japonês inteiramente novo, continuaram o caminho a pé. Entre casas cobertas de sapé construídas em jardins sombreados de palmeiras, mamoeiros e árvores de fruta-pão, a rua estreita ia dar na praça do mercado central. Parando, Will apoiou-se no bordão de bambu e olhou à sua volta. Num dos lados da praça se erguia uma verdadeira obra-prima do rococó oriental! A fachada de estuque cor-de-rosa, tendo um mirante em cada um dos seus quatro cantos, dava a impressão de ser a prefeitura local. À sua frente, no lado oposto da praça, via-se um pequeno templo de pedra rosada tendo uma torre central, na qual, dispostas em várias fileiras, uma série de figuras esculpidas contava as lendas do progresso de Buda desde sua infância mimada até se transformar em Tathagata. Entre esses dois monumentos, a maior parte do terreno era coberta por uma enorme figueira-de-bengala. Ao longo de corredores sombreados e sinuosos, enfileiravam-se as barracas de um grupo de vendedores de ambos os sexos. Atravessando fendas das abóbadas verdes, os longos e curiosos raios de sol mostravam, aqui, potes de água amarelos e pretos; ali, uma pulseira de prata, um brinquedo de madeira pintada e um pedaço de fazenda estampada. Adiante, uma pilha de frutas, um corpinho de menina alegremente estampado com flores, o lampejo de olhos e dentes de alguém que sorri e o saudável dourado de um torso nu.
— Todos parecem tão saudáveis — comentou Will, enquanto caminhavam entre as barracas e à sombra da grande árvore.
— Sua aparência é saudável simplesmente porque são realmente saudáveis — disse Mrs. Rao.
— E felizes, para variar.
Pensava nos rostos que vira em Calcutá, em Manilha, em Rendang-Lobo — os mesmos rostos que também podiam ser vistos diariamente em Fleet Street e no Strand.
— Mesmo as mulheres — comentou, olhando cada rosto —, mesmo as mulheres parecem felizes.
— Elas não têm dez filhos — explicou Mrs. Rao.
— Do lugar de onde venho, elas também não têm dez filhos — disse Will. — Apesar disso… «Sinais de fraqueza, sinais de infelicidade.» — Fazendo uma pausa, olhou da face de uma vendedora de meia-idade que pesava fatias de fruta-pão secas ao sol para a de uma jovem mãe que carregava seu bebê numa sacola presa às costas. — Há uma espécie de esplendor — concluiu.
— Graças à maithuna — disse triunfalmente Mrs. Rao. — Graças à ioga do amor.
Em seu rosto brilhava um misto de fervor e de orgulho profissional.
Enquanto andavam, deixaram uma faixa ensolarada e quente e, subindo uma escadaria de degraus bastante desgastados, atingiram a obscuridade de um templo. Um gigantesco Bodhisattva dourado surgiu da escuridão. No meio do cheiro de incenso e de flores murchas escutava-se, vindo de algum lugar atrás da estátua, um adorador invisível a murmurar uma ladainha sem fim.
Silenciosamente, de pés descalços, uma criança entrou apressada por uma porta lateral. Sem prestar atenção aos adultos, subiu até o altar com a agilidade de um gato e depositou um ramo de orquídeas na mão estendida da estátua. Feito isso, olhou para a enorme face de ouro, murmurou algumas palavras, fechou os olhos por um momento e murmurou novamente. Desceu do altar, cantando para si mesma, e saiu pela mesma porta por onde entrara.
— Encantadora — disse Will, enquanto a via afastar-se. — Não poderia ser mais graciosa. Contudo, que é que uma criança daquela pensava estar fazendo? Que espécie de culto religioso era aquele?
— Ela pratica a variedade local do budismo mahayana e também um pouco de xivaísmo.
— E vocês, intelectuais, encorajam essas práticas?
— Não encorajamos nem desencorajamos. Apenas aceitamos. Aceitamos como se aceita a teia de aranha ali na cornija. Devido à natureza das aranhas, suas teias são inevitáveis, e devido à natureza dos seres humanos as religiões também o são. Às aranhas não se pode impedir de fazer armadilhas para moscas. Os homens não conseguem deixar de fabricar símbolos. E o cérebro humano só serve para transformar em símbolos manejáveis o caos de uma determinada experiência. Algumas vezes os símbolos correspondem quase que exatamente a alguns dos aspectos da realidade exterior que se escondem atrás da nossa experiência. Somente então adquire consciência e bom senso. Outras vezes ocorre o oposto: os símbolos quase não têm ligação com a realidade exterior. Desse modo, temos a paranóia e o delírio. Freqüentemente existe uma mistura realística e em parte fantástica. E isso é a religião. Boa religião ou má religião, tudo depende da mistura do coquetel. Por exemplo, na espécie de calvinismo em que o dr. Andrew foi criado, misturou-se uma porção mínima de realismo em sua coqueteleira cheia de fantasias malignas. Em outros casos, a mistura é mais benigna. A proporção pode ser de cinqüenta, sessenta por quarenta e de até mesmo setenta por trinta, em favor da verdade e da decência.
Will concordou com um movimento de cabeça e disse:
— Realmente, oferecer orquídeas brancas a uma imagem que representa a compaixão e o esclarecimento parece bastante inofensivo. E, depois do que vi ontem, estou preparado para falar em favor das danças cósmicas e das cópulas divinas.
— Lembre-se de que isso não é compulsório — disse Vijaya. — Mas a todos é dada a chance para irem mais além. Você perguntou o que aquela criança pensava estar fazendo. Eu lhe direi: com uma parte da sua mente, ela supõe estar falando com alguém, uma pessoa enorme e divina que pode ser bajulada com orquídeas e que, no entanto, lhe dará o que ela deseja. Todavia, ela já tem idade bastante para que lhe tenham falado acerca dos símbolos mais profundos que estão representados na estátua de Amitabha. Também já deve ter ouvido falar das experiências que deram origem a esses símbolos. Disso.se deduz que, com a outra parte da sua mente, ela sabe muito bem que Amitabha não é uma pessoa. Sabe também (porque já lhe foi explicado) que, se as preces algumas vezes são atendidas, é porque neste nosso estranho mundo psicossomático os desejos têm tendência a se realizarem, quando neles nos concentramos. Já lhe ensinaram que esse templo não é mais a casa de Buda, mas apesar disso ainda gosta de imaginar que é. Sabe que não é um diagrama da sua própria mente inconsciente, um cubículo escuro com lagartixas andando de cabeça para baixo pelo teto e com baratas em todas as gretas. Todavia, no meio da escuridão povoada de vermes está a Sabedoria. E essa criança está fazendo alguma coisa além disso: de maneira inteiramente inconsciente, está aprendendo uma lição a seu próprio respeito. Já lhe foi dito que, se conseguir deixar de se sugestionar, talvez descubra que sua mente pequena e ocupada é também uma Mente com M maiúsculo.
— Em quanto tempo a lição será aprendida? Quando deixará de se sugestionar por esses símbolos?
— Talvez nunca venha a aprender. Isso acontece a várias pessoas. Para compensar, muitas outras aprendem com facilidade.
Pegando o braço de Will, guiou-o na escuridão até chegarem atrás da imagem da Sabedoria. O cantochão tornou-se mais nítido. Quase escondido pelas sombras, um homem velho e nu da cintura para cima estava sentado numa postura rígida e imóvel, e só seus lábios se moviam: parecia a estátua dourada de Amitabha.
— O que está entoando? — perguntou Will.
— Alguma coisa em sânscrito.
Sete sílabas incompreensíveis eram repetidas sem interrupção.
— Que repetição tola!
— Não é tão tola assim, pois graças a isso às vezes se consegue o que se quer — objetou Mrs. Rao.
— Ajudam pelo simples fato de serem repetidas e não pelo que possam significar ou sugerir — explicou Vijaya. — Poderia repetir «Olá trapaceiro, trapaceiro», e isso funcionaria tão bem quanto «Om», «Kyrie Eleison» ou «Láila, illa, llah». Funcionaria porque, enquanto a pessoa está ocupada com a repetição de «trapaceiro, trapaceiro», ou mesmo do nome de Deus, não pode estar inteiramente preocupada consigo mesma. O único inconveniente é que o hábito de repetir «Olá, trapaceiro, trapaceiro» pode ter conseqüências inteiramente diversas: tanto pode mergulhá-lo nas trevas da idiotia como pode levá-lo ao desconhecido mundo do conhecimento pleno.
— Pelo que estou ouvindo, acho que você não recomendaria isso à nossa amiguinha das orquídeas…
— Não recomendaria a não ser que estivesse excessivamente nervosa ou ansiosa. Contudo, isso não se dá com ela. Conheço-a muito bem, pois costuma brincar com meus filhos.
— Sendo assim, que faria no caso dela?
— Entre outras coisas, daqui a mais ou menos um ano a levaria ao lugar para onde estamos nos dirigindo agora — respondeu Vijaya.
— Que lugar?
— Para a sala de meditação.
Will seguiu-o através de uma arcada e um pequeno corredor. Abriram pesadas cortinas e penetraram numa grande sala pintada de branco. De uma grande janela à esquerda se descortinava um pequeno jardim plantado de bananeiras e árvores de fruta-pão. Não havia mobiliário, apenas algumas almofadas espalhadas pelo chão. Na parede oposta à janela havia um grande quadro a óleo. Will olhou-o de relance e depois aproximou-se para vê-lo mais de perto.
— Que beleza! — disse finalmente. — Quem é o autor?
— É Gobind Singh.
— E quem é Gobind Singh?
— É o melhor pintor de paisagens que Pala já teve. Morreu em 1948.
— Por que nunca vimos nenhum quadro dele?
— Simplesmente porque apreciamos demais seu trabalho para permitir que seja exportado.
— Ótimo para vocês, porém nada bom para nós — disse Will, olhando novamente para a pintura. — Esse homem esteve alguma vez na China?
— Não, mas estudou com um pintor cantonês que vivia em Pala, e é claro que tinha visto várias reproduções das paisagens de Sung.
— Uma autoridade em Sung que escolheu pintar a óleo e que se interessava pelo claro-escuro — disse Will.
— Isso só aconteceu em 1910, quando foi a Paris e fez amizade com Vuillard.
Will balançou a cabeça dizendo:
— É fácil perceber isso se observarmos a extraordinária riqueza estrutural de sua obra.
Continuando a olhar o quadro em silêncio, Will perguntou após algum tempo:
— Por que está pendurado aqui nesta sala?
— Dê a sua opinião.
— Será porque é o que vocês chamam um «diagrama da mente»?
— Não. O templo é que era um diagrama. Isso é algo muito melhor. É uma autêntica manifestação da Mente (com M maiúsculo) através do cérebro de um individuo. Essa manifestação está relacionada com o que sentiu e com o modo como transportou para uma tela uma paisagem que teve a oportunidade de ver. Representa o vale mais próximo, a oeste de onde estamos. Foi pintado do local onde as linhas de força desaparecem além da cordilheira.
— Que nuvens! Que luz! — exclamou Will.
— E a luz de uma hora antes do escurecer — explicou Vijaya. — Parara de chover pouco antes e o sol saíra novamente, mais brilhante do que nunca. Uma luminosidade oblíqua se filtrava através de um teto de nuvens e dava novo brilho aos moribundos clarões da tarde. Um pontilhado de luzes se espalhava sobre todas as coisas e intensificava as sombras.
— Intensificava as sombras — repetiu Will para si mesmo enquanto olhava o quadro. A sombra daquele maciço de nuvens, que se assemelhava a um verdadeiro continente, tornava quase negra toda a extensão da cordilheira. A meia distância, ilhas de nuvens formavam novas ilhas de sombras. E entre aquela sucessão de sombras se destacava o brilho do arroz novo, as tonalidades quentes da terra lavrada, a incandescência do calcário virgem e as grandes manchas escuras alternavam com o fulgor de diamantes que se irradiava das flores eternamente verdes. No centro do vale erguia-se um grupo de distantes e minúsculas casas de sapé. Apesar da distância e das dimensões, como eram perfeitas, nítidas e cheias de significação! Significativas, mas, quando se indagava interiormente sobre seu significado, não se obtinha resposta. Will formulou a pergunta.
— Qual o seu significado? — repetiu Vijaya. — Elas são o que são. O mesmo se aplica às montanhas, às nuvens, às luzes e às sombras. Por essa razão, consideramos este quadro uma imagem autenticamente religiosa. Os quadros pseudo-religiosos sempre têm alguma outra significação além das coisas que estão representando, algum fragmento de tolice metafísica ou algum dogma absurdo sobre a teologia local. Uma imagem verdadeiramente religiosa é sempre intrinsecamente significativa. Por isso, penduramos este tipo de quadro nas nossas salas de meditação.
— Sempre paisagem?
— Quase sempre. As paisagens realmente fazem com que as pessoas se lembrem de quem são.
— E serão melhores do que as cenas da vida de um santo ou de um salvador?
Vijaya balançou a cabeça.
— Em primeiro lugar aí está a diferença entre o objetivo e o subjetivo. Um quadro de Cristo ou de Buda é simplesmente a lembrança de algo observado por um behaviorista e interpretado por um teólogo. Porém, quando se é confrontado com uma paisagem como esta, é psicologicamente impossível que seja vista com os olhos de algum J. B. Watson ou com o cérebro de um Tomás de Aquino. A submissão a essa experiência imediata é quase que forçada e a pessoa é praticamente compelida a representar um ato de autoconhecimento.
— Autoconhecimento? Como assim?
— Sim, autoconhecimento — insistiu Vijaya. — A vista deste vale é a projeção da sua própria mente, da mente de todos, tal qual existe, acima e abaixo do nível da história de cada um. São os mistérios da escuridão, de uma escuridão fervilhante de vida. Verdadeiros apocalipses de luz: o brilho da luz das frágeis casinhas, das árvores, da grama ou dos espaços azuis entre as nuvens, tem a mesma intensidade. O homem é tão divino quanto a Natureza e tão infinito quanto o Vazio. Isto é um fato que resiste a todas as tentativas que fazemos para negá-lo. Desse modo, estamos ficando perigosamente próximos à teologia e ninguém jamais foi salvo por uma teoria. Aferremo-nos aos dados e aos fatos concretos.
Apontando para o quadro, Vijaya continuou:
— E os fatos concretos estão todos representados neste quadro: metade de uma vila iluminada pelo sol, enquanto a outra está envolta em sombras e em mistério. Montanhas azul-escuras encimadas por fantásticas massas de vapor. Lagos azuis no céu, lagos verde-claros contrastando com o áspero marrom— avermelhado da terra iluminada pelo sol. Essa grama em primeiro plano, essa moita de bambus a poucos metros da encosta… No vale, pequeninas casas… Mais adiante, picos de seiscentos metros de altura. As paisagens não dão a noção de distância e por isso são os motivos religiosos mais autênticos.
— Será porque a distância nos encanta a vista?
— Não. É porque lhe empresta realidade. A distância nos lembra que no universo existem muitas outras coisas além das pessoas, e que para os seres humanos existe muito mais além do que outros tantos seres humanos. Faz-nos lembrar que dentro de nosso cérebro existem espaços tão grandes como os que vemos no mundo que nos rodeia. A experiência da distância interior e exterior, da distância no tempo e no espaço, é a primeira e fundamental experiência religiosa. Oh, morte em vida, os dias que não mais existem! — citou. — Oh, lugares! O infinito número de lugares que não são este lugar! Prazeres passados, infelicidades e introspecções passadas: todas tão intensamente vivas em nossas memórias e, no entanto, todas mortas, mortas sem a esperança de ressurreição! E, no vale, a povoação que, apesar da distância, vemos com nitidez no meio das sombras é tão real e tão incontestável quanto isolada e fora de alcance. Um quadro como este é a prova da capacidade humana de aceitar todas as mortes em plena vida, todas as ausências sorvidas que envolvem cada presença. Para mim, a pior faceta dessa arte não-representativa repousa na sistematização das duas dimensões e na recusa de levar em conta a experiência universal da distância. Em matéria de cores, um quadro de expressionismo abstrato pode ser considerado uma obra de arte. Mas pode também vir a ser encarado como se fosse uma simples glorificação de um dos borrões do teste de Rohrschach. Todos podem encontrar nele uma expressão simbólica dos seus próprios temores, luxúrias, ódios e sonhos. Será que alguém pode vir a descobrir, num desses quadros expressionistas, coisas que transcendem o humano e que só descobrimos em nós mesmos quando a mente se defronta com as distâncias exteriores da natureza que nos circunda? Será que alguém consegue analisar simultaneamente as distâncias interiores e exteriores através de uma paisagem como a que estamos vendo agora? Tudo que sei é que em suas abstrações eu não encontro as mesmas realidades que são reveladas aqui, e tenho dúvidas de que alguém consiga encontrar. Por esta razão, considero o seu expressionismo moderno sem objetivo e tão fundamentalmente irreligioso. Devo acrescentar, ainda, que mesmo o melhor deles é profundamente enfadonho e vulgar.
— Costuma vir sempre aqui? — perguntou Will após uma pausa.
— Sim. Todas as vezes que sinto vontade de meditar em grupo, em vez de sozinho.
— Isso se dá com muita freqüência?
— Acontece, em média, uma vez por semana. Algumas pessoas preferem fazê-lo com maior freqüência, outras muito raramente, havendo também aquelas que nunca o fazem. Isso depende do temperamento de cada um. Nossa amiga Susila, por exemplo, necessitando de uma dose maior de solidão, raramente vem até aqui, enquanto Shanta, minha esposa, gosta de vir até aqui quase que diariamente.
— Eu também — disse Mrs. Rao. — Mas era de se esperar — acrescentou com uma risada. — As pessoas gordas apreciam a companhia de outrem, mesmo quando estão meditando!
— A senhora utiliza este quadro para meditar? — perguntou Will.
— Não medito nele. Dele retiro a meditação, se é que você entende o que quero dizer. Para ser precisa, medito paralelamente a ele. Eu e os outros o olhamos e isso nos lembra quem somos e quem não somos, e o modo pelo qual aquilo que não somos pode vir a se transformar no que somos.
— Existe alguma ligação entre o que a senhora acaba de dizer e o que vi lá no templo de Xiva?
— Claro que há. O moksha e a meditação nos levam ao mesmo lugar.
— Então, por que dar-se ao trabalho de meditar?
— Isso seria o mesmo que perguntar: «Por que dar-se ao trabalho de comer?»
— Mas, de acordo com sua teoria, o moksha é alimento!
— É um banquete! — disse enfaticamente. — Justamente por essa razão deve haver meditação. Não se pode ter banquetes todos os dias, pois são muito copiosos e demasiado longos. Além do mais, os banquetes nos são proporcionados por um fornecedor e não se toma parte nos seus preparativos. Nossa alimentação diária é preparada por nós e o moksha entra nela como um prazer ocasional.
— Em termos teológicos, o moksha nos prepara para a recepção de graças imerecidas: as visões pré-místicas ou as experiências místicas propriamente ditas. A meditação é um modo pelo qual se coopera com essas graças imerecidas — disse Vijaya.
— Como assim?
— Cultivando um estado de espírito que permita que esses clarões de êxtase ofuscante se transformem numa «iluminação» permanente. É necessário também que cada um se conheça até o ponto em que não possa mais ser impedido pelo subconsciente de fazer as coisas horríveis, absurdas e estultas que são feitas com tanta freqüência.
— E isso ajuda alguém a ser mais inteligente?
— Não mais inteligente em relação à ciência ou à argumentação lógica, e sim no que diz respeito aos níveis mais profundos das experiências concretas e das relações pessoais.
— Mais inteligente nesse nível, embora se possa ser muito pouco dotado em outros níveis — disse Mrs. Rao, batendo com a mão no alto da cabeça. — Sou parva demais para entender as coisas que o dr. Robert e Vijaya sabem: genética, bioquímica, filosofia etc. Também não tenho dotes para a pintura, a poesia ou para o teatro. Não possuo talentos ou habilidades. Assim sendo, deveria me sentir horrivelmente inferior e deprimida. No entanto, não me sinto assim, graças ao moksha e à meditação. Não possuo talentos ou habilidades, porém no que se refere a viver, a compreender as pessoas e a ajudá-las, sinto-me cada vez mais hábil e sensível. Quando se chega àquilo que Vijaya chama de «graças imerecidas»… Você pode ser o maior gênio do mundo, porém não pode ter nada além daquilo que me foi dado! Não é verdade, Vijaya?
— Sim. É perfeitamente verdadeiro.
Ela voltou-se novamente para Will, dizendo:
— Como vê, Mr. Farnaby, Pala é o lugar ideal para as pessoas estúpidas. A maior felicidade para a maioria. E nós, os estúpidos, somos a maioria. Reconhecemos a superioridade e sabemos muito bem que a espécie de inteligência de pessoas como o dr. Robert, Vijaya e o meu querido Ranga é tremendamente importante. Sabemos também que nossa espécie de inteligência é importante e não os invejamos porque recebemos tanto quanto eles. Algumas vezes recebemos mais.
— Sim — concordou Vijaya. — Algumas vezes recebem até mais, pela simples razão de que um talento na manipulação de símbolos tenta seus possuidores a continuar manipulando-os, o que constitui um obstáculo à experiência concreta e à recepção de graças imerecidas.
— Desse modo — disse Mrs. Rao —, não precisamos que tenham tanta pena de nós. — Olhou para o relógio. — Meu Deus! Se não me apressar chegarei tarde para o almoço dos Dillip.
Dizendo isso, encaminhou-se rapidamente para a porta.
— Tempo, tempo, tempo — brincou Will. — Horário, mesmo neste lugar de infinita meditação. A hora do almoço interrompendo incorrigivelmente a eternidade. — Deu uma gargalhada e continuou: — Nunca aceite um «sim» como resposta. A natureza das coisas é sempre negativa.
Mrs. Rao parou por um momento e, olhando-o, disse com um sorriso:
— Algumas vezes é a eternidade que milagrosamente interrompe o tempo e mesmo a hora do almoço. Até logo.
Agitando a mão num movimento de despedida, ela se foi.
— O que é melhor, nascer-se estúpido numa sociedade inteligente ou nascer-se inteligente numa sociedade de mentecaptos? — Will pensou alto, enquanto acompanhava Vijaya através da penumbra do templo para o descampado iluminado pelo sol do meio-dia.